Fonte da imagem: Arte/Folha de S.Paulo
A reportagem abaixo é um absurdo. E o pior disso tudo é que o que eu estou escrevendo é que acaba por parecer absurdo. Por outras palavras, a razão ardilosa, que contamina a razão vulgar, dá tons de cientificidade a um trabalho que é altamente tendencioso e que, claramente, está vinculado e compromissado com as macroestruturas de pressão sobre a terra, ou, se se preferir, sobre o território.
A reportagem, como se poderá ver, defende que “cientificamente” e “economicamente” alguns lugares são mais vocacionados a servirem de áreas de proteção para grandes mamíferos predadores (no caso, os canídeos e felinos)... Na verdade, e, curiosamente, a grande maioria das áreas estipuladas pelos pesquisadores, está nos Países do Sul, com destaque para a África e a Caatinga brasileira.
Para não me delongar muito, e, para guiar o internauta na leitura da reportagem, lanço as seguintes perguntas:
1) Por que na Europa não foi prevista nenhuma área de preservação?
2) Por que nos EUA essa área é tão pequena (e está especialmente a noroeste, quase na fronteira como Canadá)?
3) Por que o critério utilizado foi o econômico, quando muito travestido de “biológico”?
4) Os mamíferos predadores de grande porte não estariam sendo usados como pretexto para que mantenhamos (nós, os Países do Sul) intactas grandes áreas repletas de recursos?
EDUARDO GERARQUE
da Folha de S.Paulo
Um estudo que tenta adequar os esforços para salvar espécies ameaçadas à realidade econômica acaba de mapear lugares onde preservar mamíferos carnívoros é não apenas bom, mas também barato. Após listar as regiões mais críticas no mundo usando só critérios biológicos, os cientistas cruzaram os dados com o preço de mercado do metro quadrado dos locais onde esses animais vivem.
O resultado do trabalho, apresentado em forma de artigo científico na edição de hoje da revista "PLoS One", é um mapa inédito, que mostra onde é mais viável, economicamente, preservar carnívoros ameaçados de extinção. Esse grupo animal é importante porque está no topo da teia alimentar.
"Temos um mapa para mostrar aos investidores. Entre as áreas que já são prioritárias, essas estão na frente, por critério científico e econômico", diz Rafael Loyola, coordenador do Laboratório de Ecologia Aplicada e Conservação da UFG (Universidade Federal de Goiás). O cientista assina o trabalho ao lado de outros seis pesquisadores, todos de instituições brasileiras.
"É verdade que os valores são médios e podem variar bastante dentro de uma mesma região estudada. Mas, como os recursos para a conservação são sempre escassos, o mapa pode ser uma ferramenta importante", afirma Loyola.
O Brasil, mais precisamente o cerrado, aparece em vermelho nesse zoneamento econômico da preservação dos carnívoros mundiais. "Nessa região, bichos como a onça-pintada e o lobo-guará, por exemplo, estão entre os mais ameaçados."
Somadas todas as 15 regiões "insubstituíveis" para a conservação dos grandes carnívoros, indicadas no mapa, são 11,4 milhão de quilômetros quadrados que precisam ser monitorados (pouco mais de 2% da superfície total da Terra).
O valor médio desse quilômetro quadrado, segundo o estudo, sai pela bagatela de US$ 932 mil -só US$ 0,9 o metro quadrado, aproximadamente.
O mapa não é para nenhum corretor sair com ele embaixo do braço, tentando vender trechos de terra no varejo, lembram os cientistas.
Como animais ameaçados como os tigres da China e os coiotes das montanhas Rochosas (EUA) precisam de muita área para sobreviver, a conservação só vai mesmo ocorrer se áreas extensas forem transformadas em zonas de proteção.
"Os grandes investidores, neste caso, devem ser as ONGs internacionais, os governos ou até mesmo os grandes proprietários de terra", diz Loyola.
Hoje no Brasil, por exemplo, donos de terra podem ter isenção fiscal caso resolvam deixar sua vegetação nativa intacta.
Entre áreas mapeadas agora, as da África, indica o pesquisador da UFG, são ainda mais baratas em comparação com as demais. África Central e Madagascar, na opinião de Loyola
Disponível em:
< http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u615598.shtml>.
Acesso em: 28 ago. 2009.