Tempo faz que me pergunto sobre o que está acontecendo com as cerimônias... Durante a “Feira das Profissões” da PUCRS, um especializadíssimo professor (que, por razões éticas, omitirei o nome) falava, com outro também importante professor (que, pelas mesmas razões, também não revelarei o nome), acerca da quebra de protocolo que anda verificando nas Universidades por onde passa. Nas palavras dele: “O senso acadêmico está se perdendo. As defesas de dissertação e de tese já não têm mais aquele sentido acadêmico que lhes é inerente! São feitas de qualquer jeito! Feitas de modo tão simplista [e notem que há uma diferença entre o ‘simples’ e o ‘simplista’] que beira à desconsideração em relação à importância do evento!”. Em outras palavras, o que o professor estava querendo dizer, e eu o sei porque participava da conversa, é que as coisas que dantes eram permeadas por toda uma cerimônia já não mais o são. As pessoas, por ignorância, estão perdendo a ligação entre um ato determinado (formatura, casamento, enterro, etc.) e o sentido último que este ato tem; que, justamente, de sua parte, recebe a devida homenagem/ lembrança/ memória através da cerimônia.
As coisas vão mesmo de mal a pior! Nem mais nosso Hino Nacional é cantado da forma como prevê o protocolo cívico. E isso não é absolutamente novidade. Faz-se de qualquer jeito, e, em muitas vezes, acaba virando samba – e de péssima qualidade. A postura das pessoas é que, em última análise, permite que isso ocorra. E isso é fruto da ignorância. Maldita seja! Esses dias, vi meninas frente a um momento cívico, a Execução do Hino Nacional, em uma posição tão relaxada que me deu pesar...
Falando em pesar, o substantivo masculino, por esses dias, fui num enterro. Um amigo havia perdido um ente querido (não revelarei o nome do amigo por razões já aludidas acima). Fui para manifestar meus sentimentos. Foi o enterro mais frio que já vi na minha vida! Rápido, sem orações, nada: nenhuma Ave Maria foi rezada, nenhum Pai Nosso. Nenhuma oração (protestante, budista, xintoísta, espírita, umbandista que fosse...). Nenhum pastor, nenhum padre. Enfim, ninguém que representasse o humano que se comunica (ou pretende se comunicar) com o além vida, o transcendente. O caixão simplesmente foi colocado no túmulo, foi lacrado, e todos foram embora. Enquanto as últimas pás de cimento eram colocadas na pedra que selava o jazigo, reparei que algumas pessoas riam, atendiam o telefone, conversavam...
Para mim, tudo aquilo foi muito estranho... Não quero e nem estou julgando. Não quero, também, magoar ninguém ... Apenas ressalto que a falta de cerimônia, por mim presenciada, é decorrente de uma certa (ou completa) ignorância. Se parássemos para pensar no sentido da vida, naquilo que determinada pessoa representa para nós e memorássemos tudo aquilo que tal pessoa fez por nós, certamente chegaríamos à conclusão de que há merecimentos que autorizam uma despedida à altura. O mesmo vale para uma formatura, que representa a passagem de um estado anterior de desconhecimento para um mais elevado: o da cultura e/ou conhecimento científico – e não me venha alguem dizer que a formatura em gabinete gera o mesmo sentimento do da colação de grau feita em palco, com toda a cerimônia...
O que está acontecendo é que as pessoas estão se esquecendo do significado das coisas. Daí, para se relativizar uma cerimônia em honra de algo (ou de alguém), é um pulinho! Assim, se a vida nada mais significa, para que velar um corpo!? Que se enterre logo. Do mesmo modo, se um curso superior de nada vale, para que cerimônias de formatura!? Se o casamento nada mais significa, para que casar!? Se a bandeira nada mais significa, para que ficar diante dela em posição de respeito!? Etc, etc, etc... Em determinadas ocasiões a situação chega ao limite do ridículo e da total falta de conhecimento de sentido. Para exemplificar isso melhor, imaginemos ser normal que um atleta faça tremendo esforço para se superar a si mesmo, e, ao final disso tudo, não receba os cumprimentos e a devida celebração por isso: fique sem medalha alguma e seja mandado embora para casa com olhar de desprezo...
É assim que as pessoas andam vivendo a vida... De uma forma totalmente sem sentido, asignificativa: o Outro perdeu seu valor, as coisas perderam sua razão de ser (o que impera é o uso e o abuso), e, consequentemente, o próprio Eu, diante disso, se esvazia. Esse é, certamente, um dos maus dos dias de hoje, a falta de amor pelas coisas que deveriam sempre apontar para algo maior que elas mesmas. Dito de modo mais preciso: ocorre é a falta de amor pelo sentido último para o qual as coisas e pessoas apontam. Concluo dizendo que escrevi esse texto às pressas. Sem a oportunidade de refletir de forma mais profunda. Gostaria muito de saber a opinião de outrem...
Indignado (e, muito mais, triste com certas coisas que tenho visto),
Donarte.
P.s.: estará o sentido último das coisas sendo enterrado sem cerimônia!? |